sexta-feira, 20 de maio de 2016

Uma visita às ruínas do Convento de Fiães em 1903

Interior da Igreja de Fiães (Melgaço)
O Convento de Fiães foi, durante vários séculos, uma das instituições mais ricas e poderosas da região. Dizia-se que era o mais rico das Hespanhas. Em 1834, com a extinção das ordens religiosas, o convento foi vendido em hasta pública e pouco a pouco foi caindo aos pedaços. Na viragem para o século XX, já não restam muitas ruínas. Apenas a igreja resiste. No livro "Uma visita às ruínas do Real Mosteiro de Fiães", publicado em 1903, o autor, Guilherme Oliveira, conta-nos o que encontrou quando chegou a Fiães e fala-nos no estado em que se encontravam as ruínas do antigo mosteiro: "Parei. Deixei o animal em que montava, e a pé, comecei por trilhar uma extensa e larga alameda de castanheiros, olmos e carvalhos, sobre o chão claro e plano, que forma a antiga via principal do mosteiro.
Ao centro, há um cruzeiro moderno de pedra, com a data 1875! Representa uma coluna, tendo no alto uma pequena cruz com duas imagens regularmente esculturadas, e de costas entre si. Esta parte, é pintada e dourada de pouco, e a sua conservação está de acordo com a mesma data.
Achei esquisito aquele luxo, em contraposição com tanta coisa abandonada que o rodeia. No fim da alameda, e em seu paralelo, ha uma fonte de excelente e frigidíssima água, com bancos formando um círculo.
Convida o lugar a descanso e meditação. Seguem-se as ruínas. Da torre, que devia ser grandiosa, restam alguns metros de grossas paredes, formadas de grandes pedras desconjuntadas, tendo, mesmo assim nelas cravado, o enorme sino que ainda tange para o
serviço da igreja. Havia neste lugar uns vestígios de muralha, que foram propositadamente demolidos para a construção do cemitério que hoje ali existe, o qual é fechado por moderna grade de ferro.
Agora, o templo. A frente de granito, que o tempo depois de enegrecer decorou com manchas róseas, é de estilo simples e severo, predominando o gótico, de mistura com outros que as reconstruções lhe introduziram.
Tem diversas fileiras de cantaria, — a que chamam gigantes, — a toda a altura, e alguns degraus para o portal, que é do mesmo estilo, pouco ornamentado, sobre o qual, em três nichos, vêem-se as estátuas de pedra de Santa Maria, São Bento e São Bernardo, finamente trabalhadas, sendo de grande delicadeza as mãos e roupas da primeira.
Por cima, em grupo de largas dimensões, o brazão arcebispal, tendo à direita o de Portugal, e à esquerda o de uma rainha nossa que foi da casa de França. Aquele tem a cobri-lo a mitra e o báculo, e este as respectivas coroas.
No adro, que contorna o edifício, há grandes carvalhos seculares, achando-se o que enfrenta o pórtico fendido a meio por faísca, que o dilacerou há muito, vendo-se ainda a sua vestutez. Existem também de pé as paredes frontais de uma parte da ala direita do convento, a qual, como o requeria o lugar, que é de grandes ventanias e temporais tem fortes cantarias.
As janelas e portas são de pequeno formato e sem nenhuma importância arquitetónica. Eram por detrás, os claustros, dos quais ainda se vêem algumas elegantes e finas colunas, sustentando aqui um arco, ali um resto de flecha, e além formando monte.
São bem lançadas as curvas e dignas de atenção. Existem também, dispersas pelo terreno transformado em campo de lavoura, paredes com restos de janelas, ombreiras e escadas, e o lugar da fonte que abastecia o convento.
Examinando a área larga por onde se estendem os vestigios das construções extintas, é que se pode avaliar a grandeza do antigo mosteiro, do qual diz o Padre Carvalho Costa, — que a fábrica e celas dos religiosos foi “cousa grande”, durante muitos séculos em que ali viveram os monges.

Tinha o D. Abade capela particular, — chamada abacial, — a qual está assinalada por pedaços de grossos muros mal conservados. Ali, em um altar, veneravam-se as imagens de Nossa Senhora da Conceição, de grande formato, e outra menor, de S. Bernardo. Havia dependências especiais para as audiências públicas, casas de albergue alpendradas, e um corpo de edifício do uso e estado independente do superior. Era na grande sala da presidência que se resolviam os negócios do convento, na presença do escrivão de Valadares, que lavrava os prazos, fazendo constar essas formalidades com grande cerimonial..."  (Extrato retirado de: OLIVEIRA, Gilherme (1903) - Uma visita às ruínas do Real Mosteiro de Fiães. Livraria Ferreira, LIsboa.)

Sem comentários:

Enviar um comentário