sábado, 22 de fevereiro de 2014

Professor Matias de Sousa Lobato, o "Rei das Montanhas" (1859 - 1920)

(PARTE II)
O Professor Matias e as guerrilhas políticas no início da 1ª República

Prof. Matias de Sousa Lobato (de chapéu) em Castro Laboreiro (1911)

Apesar de ser uma pessoa muito popular em Melgaço mas sobretudo em Castro Laboreiro, o professor Matias de Sousa Lobato granjeou algumas inimizades. 
Na verdade, no Diário de Governo de 2 de Maio de 1912, podemos ler que o Professor Matias foi suspenso de funções devido a incompetência no exercício da docência, de acordo com o artigo evocado para a suspensão. 


(extrato do Diário de Governo de 2 de Maio de 1912)

Contudo, no Diário do Governo de 17 de Maio de 1912, é publicado o levantamento da suspensão é levantada, sendo o professor ressarcido de todos os vencimentos retirados. 
Não consegui apurar os factos concretos que levaram a esta suspensão. Sabemos que em Castro Laboreiro o professor Matias era tido com alguém muito competente no seu ofício sendo por isso surpreendente essa acusação.

(extrato do Diário do Governo de 17 de Maio de 1912)

Contudo, levanta-se a suspeita de que este episódio seja apenas mais um em que se vê envolvido o Professor Matias num clima de guerrilha política que se fazia sentir nos primeiros anos do regime republicano.
A mostrar isso, o "Correio de Melgaço" de 31 de Maio de 1914, diz-nos que “Os juízes da vara e balandrau de Castro Laboreiro, devido a desavenças políticas e desinteligências pessoais, intentaram proceder contra o digno professor da escola daquela freguesia, o comendador Matias de Sousa Lobato. A reclamação contra este homem de bem e filantropo social foi levada até às instâncias superiores (pois se ele não era de panelinha) e segundo nos consta, as mesmas vão averiguar da culpabilidade do citado professor”.
Mais tarde, no "Correio de Melgaço" de 9 de Junho de 1914 esclarece-se tudo: a Câmara Municipal de Melgaço nomeara dois delegados escolares para Castro Laboreiro os quais (sendo contrários politicamente ao Prof. Matias, então no Partido Democrático como vogal da Junta da paróquia daquela freguesia serrana), acusam o professor de incompetência, de não cumprir os seus deveres de mestre-escola. Queriam ver-se livres dele. Os correligionários de Matias de Sousa Lobato, através do Correio de Melgaço, atiram-se à Câmara e aos delegados escolares como autênticas feras. Por um lado, estava um homem com um curso, com 30 anos de bom desempenho ao serviço da instrução, do outro, segundo os do Correio de Melgaço, estavam dois analfabetos: Manuel Joaquim Monteiro e outro (talvez Francisco José Rodrigues, ajudante do registo civil em Castro Laboreiro). O jornalista apela ao bom sendo, à unidade, e não à vingança. Escreveu: “é necessário arrancar Portugal da miséria e do analfabetismo que a monarquia nos legou”. Em causa aqui também estava a pensão de aposentação do professor. O Dr. Afonso Costa, o primeiro chefe de governo republicano, descentralizara o ensino primário, atribuindo às Câmara Municipais essa responsabilidade. Ora, se um mestre de crianças fosse expulso do ensino por incompetência ou desleixo, teria que arranjar outro trabalho. Felizmente para o Prof. Matias, vieram em sua defesa Manuel António Fernandes, vice-presidente da Junta de paróquia Civil e vogal da Comissão Paroquial Republicana em Castro Laboreiro, e o Padre José António Alves, também de Castro, tendo ambos publicado protestos contra os delegados. O primeiro tinha um filho na escola e o padre fora aluno do prof. Matias e gaba a sua competência. O tempo apaziguou os ânimos e tudo continuou como dantes.
No Correio de Melgaço de 13 de Agosto de 1916, o correspondente em Castro Laboreiro escreveu: Com superior estima recebemos a notícia da próxima aposentação do nosso professor Matias de Sousa Lobato. Quando o julgávamos em águas, eis que nos apresenta com a sua nota de inatividade, como professor. Folgamos, pois, se ele folga também com o veredito da Junta Médica, e cumprimentamos o nosso Comendador – como doravante o trataremos, orgulhoso por tal se haver feito aqui”.
No meio deste clima, sabemos que em 15 de Março de 1917, o prof. Matias arrematou ao Estado por 110$00, um prédio sito em Castro Laboreiro. Devia ser a casa onde morava, na qual funcionava a escola.
Todavia, em 1919 publicou-se no Jornal de Melgaço, acerca dele, um texto repleto de ironia: ”Este ilustre cavalheiro e nobre cavaleiro veio passar as férias nesta vila. É costume, quando um funcionário está em férias, dar ordens às criadas para dizerem – a quem o procura – que está a descansar ou que não está em casa, evitando assim toda a sorte de maçadas. Mas não é assim que procede o “Leão das Montanhas” durante a sua estada nesta vila. Quase diariamente o víamos rodeado de castrejos, hoje seus conterrâneos, acompanhando-os ora para a repartição de Finanças, ora para a Administração do Concelho, ora para a Câmara, ora enfim para onde as necessidades dos seus conterrâneos chamam a presença do comendador. Vimo-lo um dia encaminhar-se para um carro onde estavam uns castrejos que depois soubemos serem parentes de José Bento Alves, António Joaquim Rodrigues, José Bento Rodrigues, José Domingues, Luís Rodrigues (o Barroso) e Adelino Fernandes que, dirigindo-se para as Astúrias, aonde iam aplicar a sua atividade, em Vigo são presos pela polícia secreta. Pernoitam uma vez em Redondela, outra em Tui e daí seguem para Valença, afim de seguirem sob prisão para o Porto. Por igual crime – o de emigração clandestina – foi preso, e remetido para juízo, um indivíduo que nesta comarca respondeu em Julho e foi condenado nas custas e selos do processo. Pois igual crime cometeram esses trabalhadores de Castro Laboreiro e o “Leão das Montanhas” vai a Valença, conseguindo fazer-se acompanhar dos seus conterrâneos que em número de seis voltam para o convívio de suas famílias, sem qualquer outra despesa que não fosse a da viagem e sustento próprio!”
Enfim, retalhos documentados da vida do prof. Matias de Sousa Lobato a quem as gentes de Castro Laboreiro da época muito ficaram a dever. Tudo isto numa época de intenso caciquismo político mesmo nos meio locais...


Castro Laboreiro em 1914


Informações extraídas de:
- Correio de Melgaço" de 31 de Maio de 1914;
- Correio de Melgaço" de 9 de Junho de 1914;
- Correio de Melgaço de 13 de Agosto de 1916,
- Diário de Governo de 2 de Maio de 1912;
Diário do Governo de 17 de Maio de 1912;
ROCHA, Joaquim, A. (2010) - Dicionário Enciclopédico de Melgaço. Edição de autor.

PS - Um especial OBRIGADO à Sra. Teresa Lobato pela partilha de informações e pela procura das suas raízes...

2 comentários:

  1. Mais uma vez, quem agradece sou eu, Valter.
    Julgo que lhe contei na altura, no verão passado, que estive no edifício onde funcionou a antiga escola onde meu tio-bisavô lecionou. Hoje é uma casa recuperada onde funciona o posto de turismo e uma pequena biblioteca em Castro Laboreiro.
    Abraço amigo
    Teresa Lobato

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  2. O professor Mathias era tio-bisavô do meu marido, pela linha paterna. O avô paterno era José de Sousa Lobato, também de S. Martinho, professor do ensino primário em Paderne e mais tarde inspector do ensino primário. Teresa Lobato, que não tenho o prazer de conhecer é portanto prima do meu marido, José Macieira de Sousa Lobato. Agradeço a investigação realizada.

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